quarta-feira, 13 de abril de 2011

valiação escolar e afetividade

A observação assistemática de crianças das séries iniciais do ensino fundamental vem produzindo discussões pedagógicas, uma vez que é cada vez mais comum encontrar no espaço escolar uma avaliação ameaçadora. Ainda, esta avaliação não vem considerando o aspecto sócio-emocional, o que resulta num distanciamento entre professor e aluno.
Temos como objetivo discutir e analisar os instrumentos de avaliação utilizados na escola, verificando as práticas que eles revelam dentro de uma perspectiva afetiva na relação entre ambos.
O cotidiano na sala de aula nos leva a verificar que existe uma proximidade entre a afetividade e o desenvolvimento cognitivo do aluno, consequentemente também na sua avaliação. O que confirma os problemas de aprendizagem causados pela má organização dos esquemas afetivos, principalmente na faixa etária de 6 a 10 anos, que compreende as séries iniciais do ensino fundamental.
Considerando que pensar e sentir são açoes intimamente ligadas, indissociáveis,ao longo deste texto, tentaremos defender esta idéia, direcionando-a ao campo educacional . Através de algumas reflexões acerca do papel da afetividade no funcionamento psicológico e na construção de conhecimentos cognitivo-afetivos.
Atualmente na escola, a avaliação tem sido praticada para aprovar ou reprovar os alunos, caracterizando-se como uma ameaça que intimida o aluno. Descomprometida com a aprendizagem do aluno, contribui para auto-imagem negativa, causando reprovação e repetência e ainda, fracasso escolar, sendo cada vez mais comum encontrar no âmbito escolar uma avaliação que prenuncia castigo.
Muitas vezes a avaliação do rendimento escolar em algumas instituições não é usada corretamente pelos professores , pois não respeitam o ambiente no qual o aluno está inserido .Ainda, numa educação que prioriza o depósito de informações, onde um ensina e o outro aprende, os instrumentos de avaliação são utilizados apenas como medidores do conhecimento, e com isso afastam-se das características humanas, caracterizando-se como uma ferramenta de exclusão escolar e social.
Observa-se ainda que esta avaliação apresente um caráter descontextualizado, autoritário e punitivo, que não considera o aspecto sócio-emocional, resultando num distanciamento entre professor e aluno.Muitas vezes, caracterizada por um processo de julgamento de valores, sobre dados relevantes da realidade em que ocorre a aprendizagem, inerentes ao contexto social ou individual de cada aluno.Este processo é subjetivo e realiza julgamentos segundo padrões pré-estabelecidos.
Neste texto, levantamos algumas questões teóricas sobre a relação da afetividade e o desenvolvimento cognitivo da criança embasadas em aportes teóricos do desenvolvimento cognitivo e do desenvolvimento afetivo analisados com uma visão psicanalítica.
Buscaremos fornecer subsídios para discussões referentes à compreensão da avaliação como processo contínuo de aprendizagem, ponderando as diferenças de cada aluno no processo ensino-aprendizagem, com respaldo teórico em autores consagrados, sensibilizando os atores do processo para essa situação-problema. Inseridos num paradigma sócio-crítico; Vygotsky, Piaget, Luckesi, Wallon, Aussubel, Esteban, Chalita, Libâneo e outros, fundamentam este texto.
Como objetivo principal, buscamos valorar a afetividade como pressuposto básico para a aprendizagem e a sua eficácia na avaliação do rendimento escolar.
“As escolas deveriam entender mais de seres humanos e de amor do que de conteúdos e técnicas educativas. Elas têm contribuído em demasia para a construção de neuróticos por não entenderem de amor, de sonhos, de fantasias, de símbolos e de dores”. CLÁUDIO SALTINI
A palavra afeto vem do latim affectur (afetar, tocar) e constitui o elemento básico da afetividade.
Segundo caracterização do Dicionário Aurélio (1994), o verbete afetividade está “Psicol. Conjunto de fenômenos psíquicos que se manifestam sentimentos e paixões, acompanhados sempre da impressão de dor insatisfação, de agrado ou desagrado, de alegria ou tristeza.
Compreendemos então que afetividade e inteligência portanto, são aspectos indissociáveis, influenciados pela socialização.
A nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), a Lei 9.394, nos oferece os dois mais importantes princípios da afetividade e amor no âmbito escolar,o respeito à liberdade e o apreço à tolerância, que são inspirados nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana. Ambos têm por fim último o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania ativa e sua qualificação para as novas ocupações no mundo do trabalho.
Piaget define a afetividade como todos os movimentos mentais conscientes e inconscientes não-racionais(razão), sendo o afeto um elemento indiferenciado do domínio da afetividade. Afirma ele, que o afeto é a energia necessária para o desenvolvimento cognitivo e estudos que integram as pesquisas de Freud e de Piaget especificam que a afetividade influi na construção do conhecimento de forma essencial através da pulsão de vida e da busca pela excelência.
Henri Wallon traz a dimensão afetiva como ponto fundamental em sua teoria psicogenética.
"As emoções, assim como os sentimentos e os desejos, são manifestações da vida afetiva. Na linguagem comum costuma-se substituir emoção por afetividade, tratando os termos como sinônimos. Todavia, não o são. A afetividade, é um conceito mais abrangente no qual se inserem várias manifestações." ( p.61)
A afetividade tem um respaldo significante sob a avaliação do aluno como um todo.
Segundo Teresa Esteban: “Avaliar o aluno deixa de significar um julgamento sobre a aprendizagem do aluno, para servir como modelo capaz de revelar o que o aluno já sabe, os caminhos que percorreu para alcançar o conhecimento, o que o aluno não sabe, o que pode vir a saber, o que é potencializado e revelado em seu processo, suas possibilidades de avanço e suas necessidades para superação, sempre transitória do saber.”
Uma reflexão ampla sobre a avaliação do rendimento escolar intimamente ligada à aprendizagem construída, identificando a interação professor-aluno, é um aspecto fundamental da organização “da situação didática” tendo em vista alcançar os objetivos do processo de ensino dentro dos fatores cogniscitivos e sócio-emocional.
“A avaliação é um ato amoroso” LUCKESI, 1997.
Fazendo uma análise da história da educação, especificamente a questão da avaliação, através dos tempos, percebe-se que desde o princípio da história da educação no Brasil e em muitos outros momentos desta história a questão de avaliar sempre esteve ligada a uma prova escrita ou oral, centrando-se o poder absoluto no professor, que avaliava e dava nota sobre o que o aluno sabia de determinado conteúdo.
E dentro desta perspectiva histórica, por muitos anos fez-se uso de métodos de avaliação como um instrumento a serviço de quem a aplicava, buscando-se em uma série de perguntas com respostas prontas a ser estudadas, decoradas e transmitidas em dias de prova. Julgava-se, dentro desta visão, que existia um controle do professor sobre a aprendizagem e sobre todo um grupo de alunos, aplicando-se a idéia de homogeneidade do saber das crianças. Isto, baseado no princípio de que o professor ensina e o aluno devolve a informação tal como foi recebida.
"...o ato de avaliar não se encerra na configuração do valor ou qualidade atribuídos ao objeto em questão, exigindo uma tomada de posição favorável ou desfavorável ao objeto da avaliação, com uma conseqüente decisão de ação." (LUCKESI: 1998, p. 76)
Ao longo da história da educação moderna e de prática educativa, a avaliação da aprendizagem escolar, por meio de exames e provas, foi se tornando algo místico, onde se faz porque tem que ser feito, na maioria não se explica ou se entende o porquê,faz porque tem que ser feito, na maioria não se explica ou se entende o porquê. Transformou-se numa espécie de “entidade” criada pelo homem para atender uma necessidade, mas que se torna independente dele e o domina.
Atualmente, a avaliação da aprendizagem escolar, além de ser praticada com uma tal independência do processo de ensino / aprendizagem, vem ganhando aspectos de independência da relação professor-aluno. As provas e exames são realizados conforme o interesse do professor ou do sistema de ensino. Nem sempre se leva em consideração o que foi ensinado

As notas são operadas como se nada tivessem a ver com a aprendizagem. A concepção de avaliação deve ir além de uma visão tradicional, que visa apenas o controle externo do aluno mediante notas ou conceitos, para ser compreendida como uma parte integrante ao processo educacional.
... o conceito "avaliação" é formulado a partir das determinações da conduta de "atribuir um valor ou qualidade a alguma coisa, ato ou curso de ação ...", que por si, implica um posicionamento positivo ou negativo em relação ao objeto, ato ou curso de ação avaliado. (LUCKESI, 1998, p. 76)
A avaliação escolar deve ser mais estudada e detalhada cientificamente, buscando considerar relações de afetividade entre professor e aluno que possam ser garantidas dentro das variadas formas de avaliação. A afetividade tem um respaldo significante sob a avaliação do aluno como um todo, devendo ter como aspecto fundamental, alcançar os objetivos do processo de ensino dentro dos fatores cognoscitivos e sócio-emocional, intimamente ligada a interação professor-aluno.
“ Na avaliação inclusiva, democrática e amorosa não há exclusão,mas sim diagnóstico e construção. Não há submissão, mas sim liberdade. Não há medo, mas sim espontaneidade e busca. Não há chegada definitiva, mas sim travessia permanente em busca do melhor. Sempre !” LUCKESI, 1997.
Para Wallon, a afetividade, além de ser uma das dimensões da pessoa, é uma das fases mais antigas do desenvolvimento, pois o homem logo que deixou de ser puramente orgânico passou a ser afetivo e, da afetividade, lentamente passou para a vida racional. Nesse sentido, a afetividade e inteligência se misturam, havendo o predomínio da primeira e, mesmo havendo logo uma diferenciação entre as duas, haverá uma permanente reciprocidade entre elas.
“(...) a afetividade depende, para evoluir, de conquistas realizadas no plano da inteligência, e vice-versa." (DANTAS, p.90, 1992).
A maneira como a escola avalia é o reflexo da educação que ela valoriza. Quando indagamos a quem ela beneficia, a quem interessa, questionamos o ensino que ela privilegia. Como instrumento de medida de conhecimento, a avaliação tem como enfoque principal aprovar ou reprovar o aluno.Desta forma, a garantia do ensino de qualidade foi abolida do processo escolar.
Assumindo um caráter pedagógico, a avaliação precisa desvincular do processo classificatório, seletivo e discriminatório, para estabelecer o básico da sua função que se aplica principalmente ao professor que a utiliza, analisando e refletindo os resultados dos alunos. Desta forma, a avaliação propicia retomada de conteúdos, novas metodologias e um redimensionamento de trajetória conforme a necessidade do momento. Enfatizando assim o processo, refletindo o ensino que busca a construção do conhecimento.
A avaliação deve ir muito além de avaliar a aprendizagem do aluno, ela ultrapassa essa dimensão avaliando em contrapartida o trabalho da escola e o desempenho do professor, promovendo a revisão e a redefinição dos objetivos propostos.
Para Philippe Perrenoud: "Mudar a avaliação significa, provavelmente, mudar a escola".
A avaliação se apresenta desta forma como o retrato da escola, demonstrando a educação que ali se aplica, desvelando a concepção de escola, de homem, de mundo, de sociedade. Acreditamos que esse é o caminho.
Avaliar o rendimento escolar portanto, é um dos elementos para reflexão e transformação da prática escolar e deve ter como princípio o aprimoramento da qualidade do ensino. Os aspectos qualitativos devem prevalecer sobre os quantitativos.
“...a inspirar amor ao trabalho sem sanções arbitrárias, já existem sanções naturais e inevitáveis. Sobretudo, evitemos fornecer às crianças a noção de comparação e medidas entre compreender a diversidade infinita que existe de caracteres e inteligência, é necessário evitar a figura de concepção imutável do bom aluno.” (FRANCISCO FERRE – de um artigo de Maurício Tragtemberg).
Avaliar, mais do que saberes técnicos, exige sabedoria para compreender a complexidade do ser humano em desenvolvimento, para relevar suas deficiências menores, para despertar valores e virtudes, muitas vezes adormecidos, e, sobretudo, um depósito de discernimento, equilíbrio, afetividade, valores morais, intelectuais, estéticos, religiosos, elementos fundamentais para a importância e a grandeza da ação do professor.
“Avaliação significa ação provocativa do professor, desafiando o educando a refletir sobre as situações vividas, a formular e reformular hipóteses, encaminhando-se a um saber enriquecido.” (HOFFMANN: 1994, p. 58)
A avaliação do rendimento escolar tem sido utilizada, como parte de uma ação política, que visa através do processo educativo, como um instrumento de legitimação da seletividade da educação, conferindo ao ensino e às escolas particular e pública um papel subsidiário diante do fracasso do aluno.
Nas escolas , onde as variáveis sócio-econômicas não justificam diretamente diferenças de desempenho, é clara a convicção de que o aluno é responsável pelo seu sucesso ou fracasso na educação.
Atualmente, a avaliação ainda não é capaz de formar sujeitos com autonomia, o que é sem dúvida uma forma de promoção do ser humano, que é essencialmente o significado da educação.
A concepção de avaliação ainda é comumente relacionada a idéia de mensuração de mudanças do comportamento humano. Essa abordagem viabiliza o fortalecimento no aspecto quantitativo.
A avaliação do rendimento escolar tem como alvo a classificação do aluno. Necessita ser redirecionada, pois a competência ou incompetência do aluno não resulta apenas da escola ou do professor, e sim de todos aqueles que participam do contexto escolar e social do educando. A avaliação ainda não contempla os aspectos qualitativos que são difíceis de serem mensurados pois, envolvem objetivos subjetivos, postura, política, crenças e valores.
Serve como um meio de controle, feito através de atribuição de pontos ou notas, para que os alunos realizem as tarefas e tenham comportamentos esperados, no qual o professor e a instituição desejam. Não se importam com o tipo de conhecimento que o aluno adquiriu, e sim, com o tipo de nota que o aluno obteve. A nota portanto, passa a apresentar um objetivo diferente da representação do rendimento do aluno.
O ponto chave da educação deve ser o aluno aprender a prender, saber pensar, ser crítico e analítico. E é dentro dessa perspectiva que a avaliação deve trabalhar.
Em relação a interação professor-aluno, percebemos que a educação atual abre um espaço para essa parceria entre ambos, verificamos que vem acontecendo um estreitamento desta relação. O que não percebemos, é a utilização da proximidade desta relação, no desenvolvimento das aulas e avaliação dos professores e alunos. Encontramos ambientes que propõem a afetividade mais como contato físico que nem sempre considera o aluno como ser autônomo, com direitos e desejos nem sempre iguais ao do professor.
“Mestre é quem, de repente, aprende.” GUIMARÃES ROSA.
Livros relacionados com o artigo: Avaliação escolar e afetividade
ARANTES, V. Cognição, afetividade e moralidade. São Paulo, Educação e Pesquisa, 26(2): 137-153, 2001; ARANTES, V. & SASTRE, G. Cognición, sentimientos y educación. Barcelona, Educar, v. 27, 2002.
DANTAS, Heloysa. A afetividade e a construção do sujeito na psicogenética de Wallon. In: DE LA TAILLE, Piaget, Vygotsky e Wallon: teorias psicogenéticas em discussão. São Paulo: Summus, 1992.
DEMO, Pedro. Avaliação Qualitativa. São Paulo, Cortez, 1987.
LUCKESI, Cipriano. Avaliação da Aprendizagem Escolar. Apontamentos sobre a pedagogia do exame. Revista de Tecnologia Educativa, ABT ano XX, nº 101, jui/ago, 1991.
LUCKESI, Cipriano. Avaliação: Otimização do Autoritarismo. Equívocos Teóricos na prática educacional, Rio de Janeiro, ABT, 1984.
PIAGET, Jean. Inteligencia y afectividad. Buenos Aires: Aique 2001.
SOUSA, Clarilza Prado (org.) Avaliação do Rendimento escolar – 6ª Edição – Campinas, SP: Papirus, 1997 – Coleção Magistério: formação e trabalho pedagógico

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